COMBATE A CORRUPÇÃO, POR Sandro Schmitz

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Nesta coluna de estreia para o site A Trombeta irei falar de temas mais jurídicos do que econômicos propriamente ditos, mesmo porque estes podem ter severas implicações na vida econômica de um país. O título do post se deve ao fato que irei falar de diversos assuntos que, todavia giram em torno de um mesmo tema: a importância do combate a corrupção. Por uma questão de organização, e, metodologia admito, irei dividir em subtemas para deixar mais claro cada item.

A desconstrução da Lava Jato

Quando, o então recém eleito, Presidente Bolsonaro formalizou o convite ao, à época, juiz Sérgio Moro para ser seu Ministro da Justiça fiquei seriamente dividido em relação a este movimento. Compreendia as razões do Presidente eleito, assim como as razões do magistrado para aceitar, mas por outro lado me preocupava seriamente o futuro da operação Lava Jato, pois o, hoje Ministro, Sérgio Moro há muito personificara a operação, ainda que involuntariamente.

Não deve ser questionada a enorme qualidade do trabalho dos procuradores do Ministério Público Federal [MPF], em especial do Deltan Dallagnol, dos diversos Delegados Federais e vários agentes federais envolvidos [PF], assim como dos outros magistrados federais, tais como a Juíza Gabriela Hardt, e, o atual Juiz Luiz Antonio Bonat, sem esquecer os desembargadores federais da 4ª Região diretamente relacionados a operação. Contudo, desde seu inicio a Operação Lava Jato ficou bastante vinculada a imagem do Juiz Sérgio Moro pela coragem que o mesmo teve em confrontar certos “coronéis” da República.

Aceito o Ministério e iniciado o ano meu temor começou a ser materializar. O ataque sistêmico a Operação Lava Jato. Sem seu maior ícone, e, maior mobilizador, a Operação se fragilizou e passamos a ver um ataque sistêmico a Operação no Congresso Nacional [Lei de Abuso de Autoridade, CPMI], no Supremo Tribunal Federal [questionamentos as sentenças de primeiro grau], social [campanhas abertas contra os magistrados e procuradores], dentre outras.

Esse filme já foi visto na Operação Mãos Limpas [“Mani Pulite”] realizada na Itália nos anos 90 ocorreu os mesmos fatos. Após um início eficaz encerrando a Primeira República Italiana e provocando a derrocada dos dois partidos que haviam governado o país até então: Democracia Cristã e Partido Socialista Italiano. A operação foi acusada de haver manipulado o sistema jurídico italiano, qualquer semelhança NÃO É mera coincidência, e em virtude disso terminou por provocar a modificação do art. 111 da Constituição Italiana que contempla o devido processo legal (“giusto processo”), dando ênfase à posição de terceiro (entre as partes) do juiz, ao aperfeiçoamento dos meios de defesa, à razoável duração do processo, a formação da prova em contraditório, dentre outras coisas. Isso não lembra nada no Brasil?

Como se pode observar, no Brasil, assim como na Itália as operações sofreram ataques diretos de seus Congressos, tendo em vista que estas terminam tendo seus membros como alvos dado seu objeto principal. Uma lição que deve ser aprendida em relação ao caso italiano é que não se vence a corrupção apenas com ação judiciária, portanto os outros poderes devem estar envolvidos, desta forma é essencial que os parlamentares não envolvidos em corrupção sejam trazidos como aliados no combate a este mal. O mesmo deve ser dito em relação ao Poder Executivo. Neste caso o Ministro Sérgio Moro deve assumir, conscientemente, seu protagonismo para recuperar a Lava Jato.

O Supremo Tribunal Federal [STF] contra a nação

Ruy Barbosa disse certa vez que: “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”. Infelizmente, as últimas notícias que vimos tendo faz com que estas palavras do patrono da advocacia pátria sejam por demais atuais.

Em recente julgamento, o Pleno do STF julgou nulas duas sentenças de primeiro grau, por violação ao contraditório e ampla defesa, em decorrência do fato que os delatados não tiveram oportunidade de se defender das acusações feitas pelos delatores de forma específica no curso do processo. A decisão foi para que o processo retornasse a fase de alegações finais para sanar esta falha. Na quarta-feira passada o Ministro Presidente Dias Toffoli determinou que se modulasse a decisão e sugeriu três requisitos: que fosse aplicada apenas individualmente a casos anteriores, haja pré-questionamento em fazes anteriores, e, o réu que solicitasse a aplicação do decisum deve comprovar efetivo prejuízo à sua defesa. Caso feita a modulação nestes termos as decisões anteriores estarão melhor preservadas, assim como é mais lógico que esta decisão seja prospectiva, ou seja, da decisão em diante, e, não retroativa em honra ao princípio da segurança jurídica.

Costumo afirmar que uma tese jurídica é pacífica quando possui dois posicionamentos, visto sempre haver divergência. Neste caso não é diferente. O Ministério Público Federal [MPF] entende que não se aplica as delações a regra geral do Processo Penal Brasileiro, tendo em vista que a delação é uma confissão feita por outro réu e não uma acusação feita pelo órgão persecutório, logo não protegida pela cláusula constitucional. A defesa alega que ao incluir nova prova pela acusação, independente da forma que obteve, o MPF deve dar prazo contraditar/defender sobre a mesma.

Penso que o MPF está indo pelo lado errado em seu raciocínio, pois sim é prova nova no lado acusatório, portanto devendo abrir prazo pela defesa, porém antes da sentença é aberto prazo para alegações finais em relação ao processo todo, e, se a impugnação as provas da delação não foi feita nesta ocasião, pré-questionamento, ocorre a preclusão da oportunidade de fazer, ou seja, não seria possível fazer este questionamento em grau recursal, especialmente em Tribunais Superiores.

É impressionante notar como em muitos casos regras processuais simples não são percebidas. Outro fato não percebido é que esta decisão pode ser, no longo prazo, mais prejudicial as defesas, pois irá provocar o saneamento dos processos e liquidar pequenas falhas que poderiam beneficiar seus clientes. Não é atropelando a Constituição que iremos garantir o combate a corrupção, mas podemos seguir as regras e ainda assim garantir um eficaz combate ao crime.

A novela do Presidente Preso

Um outro elemento desse enredo é o fato do Presidente Lula estar preso em Curitiba por sua condenação no caso Triplex e na eminência da confirmação de sua segunda condenação pelo TRF da 4ª Região. Todavia, desde 23 de setembro deste ano o Presidente Lula pode pedir sua progressão de regime para o semiaberto. Apesar disso, não o fez até agora. A despeito da evidente ironia, visto que seus militantes estão há mais de quinhentos dias gritando “Lula Livre” e agora tem de encarar que seu ícone quer permanecer preso, temos o claro esvaziamento do discurso para a esquerda.

Um dos pontos basilares do discurso pregado pela esquerda sempre foi que o processo da Lava Jato ser uma suposta perseguição ao PT, mesmo que tenha condenado pessoas de diversos partidos e empresas envolvidas em corrupção, e, que, supostamente, não havia seguido de forma estrita os ditames previstos em lei. Esta narrativa era essencial para eles sustentarem o discurso falacioso da ilegalidade da prisão de seu líder máximo. Contudo esquecem que a colaboração premiada, tão utilizada na Lava Jato, já era prevista no ordenamento jurídico, sendo amplamente utilizada pelo CADE nos Atos de Concentração Econômica quanto prevista no art. 3º, inc. I da Lei 12.850/2013, a Lei de Combate a Organizações Criminosas.

O que mais desespera a esquerda no momento é o fato que, ao pedir a progressão de regime do Presidente Lula, o MPF cumpre rigorosamente a Lei de Execução Penal [LEP], e, desta forma, prova, novamente, sua preocupação em evitar criar nulidades que possam ser arguidas pela defesa futuramente. Ao agir desta forma o MPF esvazia as bravatas de perseguição ao Lula, evidencia o fato de ele ser mais um preso dentre tantos, e, desconstrói este elemento da guerra de narrativas estabelecida pela esquerda.

Aliás, o discurso que: “sou o homem mais inocente do Brasil”, defendido por Lula só o torna mais comum no universo prisional, tendo em vista o que qualquer criminalista sabe: no presídio todos são inocentes. Qualquer advogado que tenha atuado um dia no Direito Penal sabe que ao entrar em um presídio todos os detentos dizem ser inocentes. Ao falar desta forma o Presidente Lula age como apenas mais um detento do país, nada mais. Alguns diriam que ele somente se ambientou bem a prisão ao falar assim. O que parece que o Presidente Lula não percebe é que se não progredir de regime agora, e, se confirmando a nova condenação, sua nova progressão irá ocorrer apenas em 2021.

Por último, mas não menos importante…

Uma das narrativas mais utilizadas pelos detratores da Lava Jato é que a mesma teria, em tese, colaborado para a ocorrência da crise econômica do país. Além da total falta de caráter de tentar esconder a incompetência de sua equipe econômica que acabou com os fundamentos macroeconômicos de nosso país, ainda tentaram imputar uma culpa inexistente a uma bem sucedida investida contra a corrupção feita no Brasil. Para quem não sabe, nosso país perde anualmente o equivalente a 2.3% de seu PIB em condutas ligadas a corrupção, tais como subornos, tráfico de influência, dentre outros. Conforme as investigações apuraram foram desviados da PETROBRAS o montante até agora descobertos de R$ 121 bilhões de reais.

Portanto, não foi a Lava Jato que acabou com nossa economia, foi os desmandos do governo mesmo. Ao tornar público toda esta rede de corrupção e desmantelar a organização criminosa que se instalou no estado Brasileiro, a Lava Jato estabeleceu o império das instituições, e, portanto aumentou a credibilidade das mesmas, agora sendo atingida novamente pelo ataque a segurança jurídica. Assim sendo, é essencial o apoio ao Pacote Anticrime apresentado pelo Ministro Moro, tal como o apoio a Operação Lava Jato em um momento tão crítico que a mesma passa. Não irá ser fácil, mas deve ser feito, e, mais do que nunca os membros da operação tem que contar com o apoio da população.

Dro Schmitz dos Santos

Analista Econômico e Internacional. Doutorando em Economia[SMC/Genebra], Assessor de Investimentos, Compliance Certificado B3, Sócio Diretor da Dealers Investimentos e Participações. Especialista em Direitos Humanos, Transparência e Políticas contra a Corrupção [FDH/Santiago, Chile], Colunista de Economia da Rádio Negócios.

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